“Zona” Azul

R$ 1,50 ZONA AZUL É BARATO.

Em 2000 a banda O Rappa lançou uma música que foi vencedora de VMB em várias categorias: A Minha Alma. O sucesso foi grande, e muita gente da minha geração decorou essa letra, ou pelo menos parte dela. Mas particularmente, só vim gostar dessa música vários anos mais tarde, quando percebi o incrível paradoxo que ela transmite:
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“As grades do condomínio são para trazer proteção. Mas também trazem a dúvida se é você que está nessa prisão.”
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Pudemos acompanhar por várias semanas na câmara, com o movimento #aposente, uma intensa discussão em torno da Zona Azul em nossa cidade. Parte do debate girou em torno do preço exorbitante, R$ 1,50 por uma hora, que é superior a grandes centros de PE, como Recife e Caruaru. Uso transporte público e por isso não saberia falar sobre a gravidade disso.
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Mas no início da semana, quando a Zona Azul começou a operar, as ruas da cidade começaram a ficarem sem carros estacionados. Ou seja, o problema em torno da Zona Azul é muito mais que tarifário, trata-se de um problema de mobilidade Urbana e do nosso direito à cidade.
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Ora, temos que reconhecer um problema cultural nosso (meu e de toda população), que é a incapacidade de distinguir: calçada, faixa de trânsito, faixa de pedestre, rua, feira, público, privado, etc. Esse é um ponto.
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O segundo: como a maioria dos motoristas (e motoqueiros) dirige mal nessa cidade. Não os culpo. Quem tirou a carteira de motorista em Vitória, sabe muito bem o esquema imoral que é para se habilitar. Quer dizer, o Detran em Vitória é incapaz de distinguir quem sabe dirigir e quem não sabe. E as Autoescolas gostam muito disso. Menos carro no centro, pode significar menos trânsito, quem sabe.
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E o principal: as principais cidades do mundo que enfrentam esse problema de mobilidade, já estão pensando alternativas de transporte público e de locomoção. Por favor, não me digam que Vitória não vai mudar. Não é que eu espere que ela melhore, mas é que assistir às sessões na câmara na quinta e nos outros dos dias da semana ouvir isso da população, me dá uma crise de Vitoriofobia (desesperança com relação à cidade, medo de ficar aqui). E eu gosto daqui.
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Então quando eu descobri que a tarifa alta da Zona Azul foi responsável pelo esvaziamento na cidade, finalmente fiquei feliz com essa ação da gestão atual. Finalmente me senti minimamente valorizado, por ser pedestre, e ter provado um pouco do sabor desse direito que dizem que é meu: ir e vir. 
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Quem sabe a partir dessa tarifação, as pessoas não comecem a procurar formas alternativas de locomoção, e tentem pressionar uma qualificação do transporte público nessa cidade?
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Infelizmente, meu sonho não durou muito, pois eu lembrei que apenas 91,5% da arrecadação vão direto para a empresa responsável (e apenas 8,5% para o município), que foi criada no começo desse ano. Curiosamente, um ano de eleição.
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Esse é o paradoxo que traduz a música do Rapa: exercemos nossa liberdade de ter um transporte privado, de nos locomover confortavelmente e individualmente. Mas o preço é perdermos o nosso direito de mobilidade, além de privar o coletivo.
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Sendo assim, R$ 1,50 até que é barato.

Por André Carvalho, do movimento Aposente um Vereador Vitoriense